A relação entre Argélia e Líbia é tensa há muitos anos, mas se intensificou após o estabelecimento do Conselho Nacional de Transição (CNT), o governo de transição estabelecido na Líbia em 2011 após a morte de Muammar Khadafi, e a autocracia do partido único do presidente argelino, Abdelaziz Bouteflika.
O forte apoio líbio à Frente Polisário (movimento separatista que reivindica o Saara Ocidental) até 1984, e posições igualmente linha-dura sobre Israel levaram a uma relação mais próxima entre os países na década de 70.
No entanto, as inclinações líbias para uma união política de grande escala na África impediram a colaboração formal, uma vez que a Argélia se afastou dessa ideia.
Em 1984, a Líbia e o Marrocos assinaram o Tratado de Oujda, que foi uma resposta ao Tratado de Fraternidade e Concórdia assinado em 1983 entre a Argélia, Tunísia e Mauritânia.
Essa situação afetou temporariamente as relações entre os países, causando uma divisão política na região, com Líbia e Marrocos, de um lado, e Argélia, Tunísia e Mauritânia, do outro.
O cenário mudou quando a Líbia foi convidada para participar da comissão Intermagrebina, responsável pelo desenvolvimento da União do Magrebe Árabe (UMA) em 1989, que formalizou a primeira colaboração política e econômica entre os dois países.
No entanto, a Líbia do ex-ditador Khadafi foi acusada pelas autoridades argelinas de estar envolvida na Guerra Civil da Argélia, que causou uma guerra devastadora e a morte de mais de 200 mil pessoas.
O Grupo Islâmico Armado da Argélia, que lutou contra o governo argelino, foi apoiado pela Líbia, Marrocos, Sudão, Irã e Arábia Saudita.
Durante a Guerra Civil da Líbia, em 2011, o Conselho Nacional de Transição (CNT), reconhecido como anti-Khadafi, acusou a Argélia de apoiar o ditador ao permitir a entrada de armamentos militares e combatentes estrangeiros em seu território.
Contudo, Khadafi acabou caindo sob forte influência do governo de Barack Obama, que confessou anos depois que seu “pior erro” na presidência foi não planejar uma Líbia pós-Khadafi. Isso porque a situação no país se deteriorou completamente e se fragmentou mais do que já era.
Desde que o ex-ditador caiu e foi morto pelas mãos dos próprios líbios nas ruas de Trípoli, o país teve mais de 6 governos diferentes e viu uma onda de limpeza étnica contra trabalhadores do Mali.
Por conta da fragmentação política e de forças paramilitares, o país se tornou a capital mundial do contrabando de pessoas e armamentos. O trabalho de construir a lei e a ordem foi terceirizado para grupos rebeldes, que se mostraram incapazes de fazê-lo.
O general Khalifa Haftar, patrocinado pela ONU, assumiu o controle do Exército Nacional da Líbia e, desde então, tenta controlar a capital do país. Contudo, também é incapaz de estabelecer a lei e a ordem no país, terceirizando para as milícias locais.
A Argélia, no entanto, não reconhece o governo de Haftar, justamente porque ele não é o único que disputa pelo poder.
Diante desse cenário político caótico, a Argélia sofreu e sofre desde a queda de Khadafi. A vasta fronteira desértica da Líbia, povoada por comunidades com um longo histórico de contrabando, representa um desafio para os argelinos.
A abundância de armas e munições após a Guerra Civil na Líbia em 2011 e a capacidade dos agentes não estatais de se movimentar e operar livremente aumentaram os níveis de ameaça na região.
O país tornou-se uma das principais rotas transaarianas de contrabando de petróleo, bem como de um comércio informal de bens ilícitos para o contrabando de armas, drogas, combustível e cigarros falsos.
A disseminação das atividades criminosas generalizadas e do terrorismo islâmico, na Líbia, para além da fronteira de mais de mil quilômetros de extensão, é motivo de preocupação para os argelinos.
Principalmente pela infiltração de grupos terroristas, como a Al-Qaeda, que em 2013 usou a Líbia como base para atacar a instalação de gás Tingantourine, perto da cidade de Ain Amenas, na região desértica da Argélia.
Durante o ataque, cerca de 150 argelinos e dezenas de estrangeiros foram sequestrados, além de mais de 40 funcionários da instalação terem sido mortos.
Dessa forma, a Argélia passou a estreitar cada vez mais sua fronteira com a Líbia, acumulando milhares de tropas, veículos militares e apoio aéreo nessa região, que Haftar considera ser de seu domínio.